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Preços por m2 em Lisboa
A bolha no imobiliário e o impacto do preço médio por m2.
O que acontece quando pessoas compram um imóvel num país que não conhecem e por isso não conseguem distinguir as zonas mais procuradas (ou valorizadas) das menos procuradas, a melhor ou pior qualidade de construção, ou o valor real do preço pedido? O que acontece se o principal objetivo dessas pessoas é a mera obtenção de um visto de residência ou benefício fiscal? E se o termo de comparação com outras cidades são imóveis com preços três ou quatro vezes mais elevados?
Os vendedores desses imóveis têm tendência para colocar à venda imóveis de qualidade inferior e promove-los como sendo de qualidade superior. E vão estabelecer preços acima do seu real valor, de modo a maximizar o seu lucro. Este foi o cenário do imobiliário em Portugal, desde meados de 2014, que começou com milhares de chineses (e outros) a adquirir imóveis para a obtenção de vistos Gold e permaneceu na medida em que Lisboa se tornou cada vez mais atrativa a turistas, novos residentes e empreendedores.
Neste caso de informação assimétrica, apenas os vendedores conheciam o valor dos seus imóveis e contavam com a cumplicidade de mediadores e intermediários que chegavam a somar em comissões cerca de 20% do preço. Os compradores não sabiam em quem confiar. Efetivamente, o limite mínimo do seu investimento estava pré-estabelecido e foi motivado por um benefício não correlacionado com o valor do ativo. O incentivo colocou no mercado imóveis cujo valor real estava abaixo de 500.000€ e, podendo optar, eram os de menor valor que entravam no mercado e não os mais próximos de valerem 500.000€. Pessoas com imóveis de qualidade e área superior começaram a guiar-se por estes imóveis e a especular com base no preço da casa do vizinho, acrescentando a comissão da mediadora, nunca inferior a 6%. Afinal, era a mediadora que dizia ter compradores para aquele nível de preços. O efeito avalanche começou no Parque das Nações e outros edifícios com construção mais recente e estendeu-se aos bairros históricos, nos quais qualquer casinha de bonecas com vista de rio, chão de tábua corrida em ruas com fachadas de traça antiga se tornou uma pechincha para franceses, americanos e todos aqueles que compraram uma casa por graça, aquando de uma semana de férias em Lisboa, não se importando minimamente com o preço. E tudo mudou.
Anos mais tarde, a pool de fervorosos compradores estendeu-se aos portugueses, assustados com a escalada de preços e forçados a tomar a decisão de comprar, não apenas porque a idade, a família a crescer ou a conjuntura o exigem, mas também porque o senhorio decidiu vender a casa ou subir a renda. Sejam portugueses ou estrangeiros, com maior ou menor poder de compra, a subida de preços abrandou. Os compradores inicialmente desinformados ou inexperientes estão neste momento a agir com maior ponderação face à incerteza do que pode acontecer ao mercado imobiliário e a assumir que o valor real do imóvel se situa algures no meio entre o preço de um imóvel de má qualidade e de um imóvel de elevada qualidade. Como é que isto pressiona o mercado?
Os compradores baseiam-se em preços médios de zona e nas avaliações enviesadas de mediadores que lhes garantem que conhecem outros imóveis semelhantes e que conseguem determinado valor pela venda do seu, que é sempre melhor do que os outros. É isso que quer ouvir para assinar o contrato, não é? A distinção de qualidade é absolutamente subjetiva e a referência passa a ser o valor médio/m2 de cada zona. Os media ajudam. No Verão de 2017 a revista Sábado entrevistou-nos durante 40 minutos no sentido de perceber o que se passava com o imobiliário e acabou por publicar um mapa com valores/m2. A Visão fez o mesmo. A opinião que transmitimos foi a de que os preços médios por metro quadrado valem zero na apreciação que fazemos aos imóveis e no aconselhamento que prestamos aos clientes. E o facto de as pessoas compararem ananases com limões com base na localização tem consequências.
Através de um preço médio de referência, os imóveis de elevada qualidade saem do mercado, porque os seus proprietários sabem que o valor é superior comparativamente aos imóveis que estão em venda. Sobretudo numa cidade como Lisboa, com uma enorme diversidade de construção e idade, menor à medida que aumentam os edifícios reabilitados.
A qualidade da oferta deteora-se, mas o mercado continua a responder à procura e a escoar imóveis de qualidade cada vez menor, a preços cada vez mais elevados. A escassez de imóveis cujo valor real corresponde ao que os compradores pagam aumenta, até ao equilíbrio no qual os compradores já não compram porque apenas encontram imóveis de baixa qualidade.
E são estas pessoas que mais comummente nos pedem ajuda. A informação assimétrica e o desafio de os compradores terem que tomar decisões desinformadas com base numa tendência causada pela informação assimétrica em vez da valorização, retirou os imóveis de qualidade superior do mercado e trouxe principalmente imóveis em estado de degradação, apresentados como oportunidades de investimento, imóveis com remodelações baratas. Sem alternativa, quem precisa de comprar, sente-se pressionado pela subida de preços e cede aos argumentos dos vendedores.
Um exemplo deste comportamento pode ser observado na crise financeira entre 2007 e 2012. Os bancos estavam entupidos com ativos tóxicos, causados pela oferta de crédito incobrável, e tinham melhor informação acerca da toxicidade desses ativos do que o mercado. A diferença é que os investidores e os bancos avaliam riscos melhor do que o cidadão comum. Os bancos deixaram de poder vender os ativos de qualidade. Mas ao saberem disto e não quererem comprar mais ativos de baixa qualidade, o mercado colapsou.
Condições de um mercado caracterizado por informação imperfeita
- Informação assimétrica: os compradores não conseguem perceber o valor de um ativo antes da compra, mas os vendedores conseguem;
- Seleção adversa: existe um incentivo para que os vendedores coloquem no mercado imóveis de baixa qualidade publicitados como de melhor qualidade;
- Falta de estrutura de avaliação: os compradores não possuem mecanismos de avaliação credível, nem conhecem por dentro o estado dos imóveis que já foram vendidos, por isso, a qualidade é difícil de distinguir;
- Elevada variação de preço: existe uma elevada variação entre o preço anunciado e o preço real de venda. Não existe transparência e apenas o vendedor e o mediador sabem o preço real de venda após negociação, o preço da comissão que foi pago pelo comprador e englobado no preço da casa;
- Falta de garantias no mercado de imóveis usados: os imóveis são vendidos tal como estão, sem qualquer inspeção técnica, garantias face à estrutura ou outras proteções legais que responsabilizem o vendedor e o mediador pelas informações prestadas e ocultadas.
Confiança no mercado imobiliário
A confiança é de extrema importância para a estabilidade do mercado. Um mercado sujeito ao problema da seleção adversa, resultante da assimetria de informação, pode inverter a sua tendência e entrar numa bolha negativa, na qual um ativo será trocado por um preço abaixo do seu valor real.
À medida que o preço do mercado de um ativo cai para um nível suficientemente baixo, o valor potencial da compra aumenta para um nível suficientemente elevado para atrair compradores não especialistas. Por outro lado, numa bolha negativa é mais provável que os compradores especialistas procurem pechinchas. A situação atual do mercado imobiliário é uma imagem espelhada de bolha negativa que perdurava há décadas, refletida em bolha positiva através do investimento estrangeiro. Esta condição é mais duradoura nos mercados em comparação com bolhas negativas, por que estimula o investimento na valorização dos imóveis, através da sua reabilitação e desenvolvimento local. Num cenário extremo, que se tem verificado em Lisboa e Porto, os compradores especialistas podem começar a ter como estratégia a alavancagem do mercado para lucrar com horizontes de investimento de curto prazo, compram para colocar imediatamente à venda (muitas vezes ainda antes de escriturar a compra), o denominado house flipping. Assim, os imóveis começam a negociar-se cada vez mais acima do seu valor real, o que pode resultar na saída daqueles que negociam em horizontes de curto prazo e entrada daqueles que compram para exploração de negócios de longo prazo. Eventualmente, como um número cada vez maior de participantes do mercado, especialistas e não especialistas, ocorrem distorções no valor percebido dos imóveis, levando a uma situação instável e à formação de uma bolha positiva. As bolhas positivas persistem até que os compradores especialistas saem do mercado.
Comprar com(o) um especialista
A análise desta dinâmica de mercado mostra que as condições que levam a cenários de perda de qualidade da oferta podem resultar numa bolha negativa, mas se essas condições forem acompanhadas de sentimentos de mercado positivamente comprometidos com a continuidade da subida de preços, pode ocorrer uma bolha positiva, porque os compradores perseguem os seus sonhos. As condições do mercado com perceção de valor real distorcida, tornam muito difícil aos compradores determinar o valor de um imóvel ou avaliar com segurança o potencial de valorização a longo prazo.
Neste contexto, o fluxo de informações é principalmente unilateral, do vendedor ao comprador e, em muitos casos, influenciadores como os mediadores criam incentivos para maximizar o sentimento global de mercado hyped, com uma tendência ascendente. O público comprador, que pode saber pouco ou nada sobre o real valor, só pode confiar que o emissor (mediador) e que seus porta-vozes (comunicação social) são verdadeiros, competentes e empenhados em acrescentar valor.
Uma das principais causas da instabilidade de um mercado especulado é que existe um incentivo claro e incontestável para que tanto vendedores como mediadores vendam imóveis de qualidade abaixo do valor real como produtos de qualidade acima do valor real. Estes incentivos, como comissões de venda e excesso de agentes mediadores em competição sangrenta por contratos, objetivos e prémios, permitem que as suas empresas lucrem desproporcionalmente com um comportamento cada vez mais manipulador e distorcido daqueles que devem ser os valores e interesses a defender. A falta de competência técnica e humana dos agentes mediadores transmitem uma sensação de responsabilidade zero e justificam as suas avaliações com o mercado. O acesso à atividade de mediação é ilimitado, implica um custo reduzido e incentiva a comportamentos anti-éticos, que por sua vez se refletem na insatisfação dos clientes. O verdadeiro modelo de negócio das maiores agências de mediação é o recrutamento de comissionistas e venda aos mesmos de formação para melhorar as suas habilidades de venda e de angariação de clientes, em vez de ser relacionada com conhecimento técnico especializado e de gestão de processos com vista a apoiar as decisões de clientes vendedores e compradores.
Sendo este o cenário, na minha opinião, a bolha não diz respeito somente à oferta e valor desajustado dos imóveis, mas também ao excesso de oferta e fraco valor acrescentado dos serviços de mediação imobiliária existentes, que entrará em colapso assim que a perceção de valor dos consumidores deixe de estar associada a quantidade/ visibilidade ilusória e passe a estar associada a qualidade. Quando as agências imobiliárias passarem prestar às pessoas o serviço que as empresas de consultoria estratégica e financeira prestam às empresas, acreditamos que o mercado estabiliza e se torna suficientemente transparente e credível para atrair investimento e valorização de longo prazo.
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Sandra Viana, LOBA House Hunting
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