Mediar é aproximar fronteiras

20 de janeiro de 2022

Quando aquilo que queremos é tomar uma decisão tão importante como a venda de património imobiliário que representa anos de trabalho, ou o investimento desses mesmos anos (passados ou futuros) na compra de uma nova casa, precisamos da melhor informação em tempo reduzido, de relaxar e de confiar.

As interações sociais têm fronteiras invisíveis, mecanismos instintivos que nos dão a ilusão de segurança.

A confiança nesse espaço cresce quando conhecemos bem as nossas fronteiras e as dos outros, de modo a podermos comunicar sem receio de nos expormos demasiado, ou de forma insuficiente. Quando o contexto é percebido como inseguro, pode haver tendência para a agressão, repulsa e manipulação no lugar da colaboração. E é isso que é commumente observado na mediação imobiliária.

Todos nós conhecemos alguém com uma experiência negativa num contexto de compra ou venda de casa. Sabemos quão importante a nossa casa é para o bem-estar e estabilidade emocional. Sabemos que as quantias envolvidas num negócio imobiliário têm um elevado peso na vida das pessoas, e sabemos que as empresas de mediação estão construídas com base em incentivos que não defendem os interesses do mercado no seu todo - vendedores, compradores, arrendatários, profissionais, comunidade, planeta - mas sim as suas metas de crescimento e lucro.

Sabemos que, na generalidade, os mediadores estão na posse de informação da qual não dispomos. O cenário atual leva-nos ainda a crer que, para atingirmos o nosso melhor resultado, alguém tem que ficar a perder, e que essa perda é inversamente proporcional ao nosso ganho.

Mediar, comprar e vender um imóvel hoje em dia pode tornar-se um equilíbrio de forças ou um braço de ferro com pessoas que não conhecemos, em quem não podemos confiar à partida, que têm acesso a algo que queremos, que defendem interesses diferentes e até mesmo opostos aos nossos. Assustador, não acha?

Quando conversamos sobre decisões importantes das nossas vidas com amigos, podemos partilhar informação que nos aproxima e essa aproximação permite que necessidades, dúvidas, motivações, expetativas, e até emoções, sejam vistas e percebidas num contexto seguro e daí nasce a colaboração. Mas essa vulnerabilidade e empatia normalmente não existem em contexto comercial/ profissional.

Em relação profissional a interação pode evoluir, mas no início tem que acomodar fronteiras muito condicionadas, que se aproximam à medida que vamos conhecendo mais e criando entendimento. Que experiências terá esta pessoa num contexto semelhante àquele em que nos encontramos? Que expetativas, que integridade terá e porque estará aqui? Que competências terá/pretende?

Estas dúvidas são bilaterais. Seja direta ou indiretamente, tudo o que fazemos é moldado pelo contexto, pelas experiências anteriores e pelo grau de confiança construído através de contínuas interações com determinada pessoa.

Como não há tempo, nem oportunidade, para desenvolvermos interações e construirmos confiança em todas as nossas relações profissionais, fazemos julgamentos superficiais baseados em crenças limitadoras e criamos elevadas defesas, que nos afastam da colaboração eficiente e, por conseguinte, daquilo que mais queremos.

Quando aquilo que queremos é tomar uma decisão tão importante como a venda de património imobiliário que representa anos de trabalho, ou o investimento desses mesmos anos (passados ou futuros) na compra de uma nova casa, precisamos da melhor informação em tempo reduzido, de relaxar e de confiar.

Queremos o caminho com menos atrito, sem jogos, sem desgaste, sem barreiras para ultrapassar. Queremos um atalho. Ou talvez não, porque o atalho apenas poupa tempo ilusoriamente. Talvez queiramos fazer o caminho como quando viajamos em férias, com entusiasmo pela aventura, com aprendizagem incluída, com novos laços criados, histórias interessantes e divertidas para contar, sem pernas partidas ou facadas nas costas, e sem despesas imprevistas. Com ânimo, tranquilidade e em segurança.

Há algo positivo em estarmos longe de casa e nos aproximarmos do desconhecido. Mediar é orientar outras pessoas neste caminho rumo ao encontro. Mediar seja o que for, é aproximar fronteiras.

Sandra Viana

LOBA

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