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O mercado imobiliário em 2021-2022
Analisemos o contexto que suportou o crescimento em 2021 e um dos fatores mais importantes a ter em conta em 2022: a política monetária e o esperado aumento das taxas de juro.
A resiliência dos preços do imobiliário no período pós pandemia
Após o arrefecimento de 2020, os preços do imobiliário inverteram a trajetória descendente e registaram um aumento de 12,2% (11,7% em Lisboa) no final de 2021, com quase 205 mil imóveis vendidos.
O que explica este crescimento após um ano e meio de pandemia e aumento da oferta?
Os dados provisórios dos Censos 2021 permitem-nos verificar que, apesar do aumento da construção, o número de casas vagas não aumentou, antes pelo contrário. Existem menos 12 mil casas vagas do que em 2011 e a sua ocupação não se deve ao alojamento local, mas sim ao aumento em 40% da população estrangeira residente em Portugal na última década, ao qual correspondem mais de 240 mil estrangeiros desde 2017, totalizando agora 555.299 e 5,4% da população total residente no nosso país. É certo que os compradores nacionais constituem a maior fatia do mercado, mas não explicam a sua valorização. Portugal conquistou o coração de novos residentes, permanentes ou não, cujos rendimentos têm pressionado os preços a subir e o investimento que tem sido feito na reabilitação de edifícios nos maiores centros urbanos tem também produzido frutos na atração de cada vez mais cidadãos e turistas estrangeiros.
Há assim um patamar do qual penso que não vamos descer, no segmento de “luxo”. Coloco luxo entre aspas no sentido de caracterizar os imóveis mais diferenciados e procurados para um público que não necessita de financiamento nem de fazer contas no momento de escolher a sua nova casa em Portugal. Apesar da conjuntura política e económica, os centros urbanos e os melhores bairros residenciais não têm muito por onde crescer, o que justifica a resiliência do seu valor de mercado. Por outro lado, os novos hábitos de teletrabalho vieram despertar o interesse dos compradores nacionais por moradias e quintas, um pouco por todo o país.
Em 2021, 31% dos imóveis residenciais vendidos foram moradias, correspondendo a 64500 unidades transacionadas. Este facto explica a liderança dos distritos de Faro e Setúbal na subida de preços, que chegou aos 26,4% e 18,7% face a 2020, respetivamente Não obstante, o maior crescimento das vendas residenciais ter sido observado em Bragança, Beja e Portalegre, com aumentos de 30% a 60% no volume de casas vendidas, face a 2020.
O clima, a segurança, a gastronomia, a proximidade com as praias e o facto de ser uma porta para a Europa, continuará a atrair capital estrangeiro, o que beneficiará a economia e manterá estáveis os preços dos imóveis com as localizações e características preferenciais destes compradores ou arrendatários. A tipologia ou área não parece que façam diferença, no sentido em que, dentro deste segmento, existem jovens, executivos, empreendedores, pequenas famílias, grandes famílias, com projetos de vida mais ou menos determinados ou duradouros, mas que procuram sempre o mesmo: a melhor localização, varanda, jardim, vista para o rio, excelente luminosidade, conforto e arquitetura.
Com o aumento dos preços dos imóveis que cumprem os requisitos de procura do mercado estrangeiro, existe um efeito de contágio, alargando-se mesmo às periferias. As famílias que antes adquiriam os imóveis mais desejados, deixaram de poder competir com grandes capitais, mas nem por isso deixaram de procurar, por necessidade imediata, ou por medo de que os preços subissem mais.
Taxas de Juro e o seu impacto no preço dos imóveis
As taxas de juro desempenham um papel fundamental na economia. A Euribor é a taxa de referência da média a que as instituições de crédito estão dispostas a conceder financiamento no mercado interbancário do euro em determinado período de tempo. É calculada diariamente com base nas cotações de um painel de vinte instituições de crédito da União Europeia e não com base em transações reais, o que tem vindo a suscitar muitas críticas e a acelerar uma reforma, de modo a evitar tentativas de manipulação do mercado. Sendo uma taxa conhecida pela sociedade em geral, a leitura dos efeitos das suas variações a longo prazo, a partir da conjuntura atual do mercado imobiliário, pode passar despercebida.
Depois da crise imobiliária de 2007, que teve início nos EUA mas arrastou a economia global, os nossos governantes, i.e., o Banco Central Europeu, ativaram políticas monetárias para dar novo fôlego à economia. Entre as várias medidas implementadas, esteve na ordem do dia a redução das taxas de juros a instituições e privados. Esta redução levou a que o preço do dinheiro baixasse, ou seja, que o acesso ao crédito se tornasse mais fácil, levando assim famílias e empresas a poder investir e consumir mais, de modo a impulsionar a economia.
A juntar a este fator, temos o facto de, nos últimos anos, Portugal ter entrado em força na rota do turismo, das estadias de curta e longa duração, com especial incidência em Lisboa e Porto. Como já foi aqui referido, a crescente atividade turística imobiliária mobilizou investimento para unidades de alojamento residencial e turístico.
Por um lado, tivemos o Banco Central Europeu que, com a sua política económica de taxas de juro a 0,0%, levou a que famílias pudessem aceder a um nível mais elevado de crédito hipotecário. Com a facilidade de crédito, estas famílias apontam a imóveis dentro do seu orçamento, levando os preços a subir. Por outro, o investimento estrangeiro a impulsionar o aumento de preço dos imóveis, catalisado por capital privado e de fundos de investimento que ainda encontram em Portugal um mercado acessível.
Se a conjuntura ficasse por aqui, teríamos aquilo que se considera a normal lei da procura e oferta. Mas o Banco Central Europeu terá a última palavra no futuro próximo do mercado imobiliário. Apesar de as taxas de juro de mercado terem aumentado desde dezembro, os custos de financiamento dos bancos permanecem, até à data, contidos e continuam em níveis historicamente baixos. De acordo com o mais recente inquérito aos bancos sobre o mercado de crédito da área do euro, a procura de empréstimos pelas empresas registou um forte aumento no último trimestre de 2021. Este aumento foi impulsionado tanto por maiores necessidades de fundos de maneio, decorrentes de estrangulamentos da oferta, como por um financiamento acrescido de investimento de mais longo prazo.
No passado dia 3 de fevereiro, Christine Lagarde apresentou as últimas decisões de política monetária do Banco Central Europeu e destacou os seguintes fatores: a escassez de materiais, de equipamento e de mão de obra continua a restringir a produção em alguns setores; os custos elevados dos produtos energéticos pesam sobre os rendimentos, sendo provável que travem a despesa; a inflação apresentou uma subida pronunciada nos últimos meses e continuou a surpreender em alta em janeiro, chegando aos 5,1%, justificada sobretudo pelos custos mais elevados dos produtos energéticos, que estão a fazer subir os preços em muitos setores, bem como aos preços mais altos dos produtos alimentares. É provável que a inflação permaneça elevada durante mais tempo do que o anteriormente esperado, mas desça ao longo deste ano; Apesar de as incertezas relacionadas com a pandemia terem diminuído um pouco, as tensões geopolíticas intensificaram‑se.
O Conselho do BCE confirmou a política monetária comunicada em dezembro de 2021, de prosseguir com a redução gradual do ritmo de compra de ativos nos próximos trimestres e cessar as aquisições líquidas ao abrigo do programa de compra de ativos devido a emergência pandémica (pandemic emergency purchase programme – PEPP) no final de março. O Conselho do BCE declarou ainda estar preparado para ajustar todos os seus instrumentos a fim de garantir que a inflação estabilize no objetivo de 2% a médio prazo. A taxa de juro aplicável às operações principais de refinanciamento e as taxas de juro aplicáveis à facilidade permanente de cedência de liquidez e à facilidade permanente de depósito permanecerão inalteradas em 0,00%, 0,25% e −0,50%, respetivamente.
Com vista a apoiar o seu objetivo simétrico de inflação de 2% e em consonância com a sua estratégia de política monetária, o Conselho do BCE espera que as taxas de juro permaneçam nos níveis atuais ou em níveis inferiores até se observar que a inflação atinge 2%, muito antes do final do horizonte de projeção e de forma durável durante o resto do horizonte de projeção, e considerar que os progressos realizados em termos de inflação subjacente estão suficientemente avançados para serem consentâneos com uma estabilização da inflação em 2% no médio prazo. Tal pode também implicar um período transitório, durante o qual a inflação se situe moderadamente acima do objetivo. O que parece uma boa notícia mas na realidade não é. Este adiamento na subida das taxas de juro não é significativo quando as taxas que estão indexadas a esta subida estão a ser usadas para créditos à habitação de muito longo prazo, na sua maioria entre trinta e quarenta anos. Ou seja, esta subida vai apanhar em cheio muitas pessoas que têm uma hipoteca a decorrer. E não será daqui a dez anos ou quinze anos, será mais cedo.
A consequência imediata é a subida das rendas mensais das hipotecas em vigor, que pode levar a um problema de liquidez das famílias. De um ponto de vista económico e de mercado, é largamente conhecido que a economia tem ciclos e padrões que tendem a repetir-se. Partindo deste ponto, podemos ver que a última descida de taxas de juro durou doze anos – de 2008 a 2020 (aqui prolongada pelos efeitos económicos da pandemia) – podendo acontecer uma subida de taxas de igual duração, o que levaria a uma consequente redução e faria com que só voltássemos a ver estas taxas de juro atuais em aproximadamente vinte e sete anos. A duração deste ciclo leva a crer que os bancos poderão mesmo vir a determinar o limite de crédito à habitação para 25 anos.
Quando começarem a subir as taxas de juro, as famílias vão começar a pagar ao banco uma prestação maior do que pagam hoje, sem que os salários acompanhem esta subida. Esta visão é hipotética, mas perfeitamente possível. Um aumento da Euribor para níveis de 2008 faria com que as rendas mensais ao banco mais do que duplicassem. A história certamente não acaba por aqui, porque a corrida à compra de casas tem por base uma falácia profundamente entranhada na nossa sociedade – o imobiliário não perde dinheiro, o valor das casas está sempre a subir. Quando observamos alterações de circunstâncias e de necessidades, como o aumento do agregado familiar, um divórcio, uma mudança de emprego, etc., percebemos que nos tempos atuais a vida tem um dinamismo de mudança de casa mais rápido que a geração anterior e suporta uma taxa de esforço demasiado elevada para o rendimento que tem. O pensamento da grande maioria das pessoas, quando questionada com a possível subida das hipotecas mensais, no limite, é de que, se não puderem pagar, vendem e geram liquidez para pagar a totalidade da hipoteca. Mas pode não correr como esperado.
Com a subida das taxas de juro o preço do dinheiro vai subir. Ou seja, o valor total e mensal das novas hipotecas vai subir, levando a que mais famílias deixem de poder investir numa nova habitação. Isto leva a que, de um modo geral, a procura reajuste os seus critérios. As pessoas interessadas em vender terão que descer o preço de venda para criar liquidez, o que levará a um ajuste negativo dos preços de mercado, sob pena de ficarem estrangulados pela prestação ao banco durante meses a fio. A esta descida natural de preços devido ao preço do dinheiro, vai juntar-se a maior oferta de imóveis, de famílias que estão em dificuldades para cumprir pagamentos. A entrada extra de imóveis no mercado derivada da subida das taxas de juro vai levar ainda a uma maior redução dos preços, já que sobe a oferta ao mesmo tempo em que desce o orçamento da procura.
O efeito dominó levará a que, em pouco tempo, muitas famílias possam ver-se na situação de não poderem pagar a hipoteca de um imóvel que adquiriram por 500.000€, do qual ainda devem 475.000€, mas o seu imóvel só vale 450.000€ devido às novas circunstâncias de mercado. Este cenário não é novidade para muitas pessoas que adquiriram casa em alta e tiveram que vender alguns anos depois, mas o preço a que o mercado estava disposto a comprar era inferior à dívida ao banco. Não é necessário que exista dificuldade em pagar a renda ao banco, o motivo da venda poderá ser qualquer um, desde um divórcio, ao aumento de família, ou mudança de emprego.
Existe, assim, o risco de que a conjuntura de mercado leve a que os imóveis futuramente não tenham valor para pagar as hipotecas ainda por liquidar - que estarão continuamente em crescente valor pois as taxas de juro estarão em ciclo de subida.
Em resumo, a economia e o mercado imobiliário em Portugal, especialmente nos grandes centros urbanos, pode estar a criar uma tempestade perfeita da qual poucos têm a perceção de que se pode estar a entrar em um ciclo negativo, de grande impacto nas finanças familiares e no comportamento do mercado, num futuro próximo.
É com base na conjugação destas duas perspetivas que, na LOBA, avaliamos o valor de cada imóvel. Em vez de meramente generalizar preços por metro quadrado, analisamos o perfil e poder de compra de quem quer viver em determinado imóvel, seja através de compra ou arrendamento. Ao traçar este perfil, torna-se relativamente fácil estimar o intervalo de valores em que o imóvel será vendido ou arrendado. A renda que paga o consumidor é determinante para calcular o rendimento esperado de um investidor que pretenda adquirir um imóvel para arrendar a longo prazo.
Na nossa opinião, é um erro tomar uma decisão com base no preço a que comprou o vizinho ou o amigo, mas a comparação tem sido a racionalização para a decisão de compra de muitos portugueses e a fixação do preço de venda é feita através dos anúncios de imóveis, na sua maioria especulativos e ilusórios. O mercado não é transparente e muitas pessoas ignoram que em certos casos os imóveis são vendidos cerca de 30% abaixo do asking price. A média de desconto de 17,2% em 2020 baixou para 14,1% em 2021. Outros são vendidos pelo próprio asking price, ou ligeiramente acima. O resultado depende da capacidade de compra e match do imóvel com as preferências do seu público, como é evidente, mas também de quão informado está o vendedor e das suas motivações de venda.
Apesar do peso que tem a habitação nas finanças familiares, estou certa de que a maioria das pessoas toma decisões de compra emocionais com base em falsos argumentos racionais. Enquanto consultora, à LOBA cumpre aconselhar os clientes a ponderarem exaustivamente a sua capacidade financeira, a ponderarem entre taxa fixa ou variável em caso de financiamento e a analisarem de forma muito prática rotinas pessoais e familiares de modo a definir prioridades e escolher o imóvel mais adequado.
Adiar a compra de casa poderá não ser a melhor decisão, é preciso é que exista uma estratégia na compra. Por outro lado, seja qual for o segmento, o momento é adequado para a venda, contando com a facilidade do crédito à habitação, sem alarmismo e sem cair no erro da especulação e da excessiva divulgação, que apenas desgastam o imóvel no mercado e levam a uma venda abaixo do preço ótimo, sujeita ainda às circunstâncias externas, cuja instabilidade se tem intensificado nos últimos dois anos.
Sandra Viana
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